Friday, October 17, 2014

Luis Sepúlveda em «Uma história suja»

A capacidade de assombro


(...)
«Para que as pessoas possam ir aos restaurantes, hotéis e bares precisam de dinheiro, e portanto de trabalho seguro e assegurado. Na verdade, ninguém se espanta perante semelhante desproporção? É verdade que a Espanha tem os serviçais e criados mais bem preparados do mundo. Filólogos, cientistas sociais, engenheiros de imagem e som, licenciados em Filosofia e Letras e um largo et cetera de profissões frustradas por um evidente atraso de desenvolvimento adornam os currículos do pessoal que serve nos milhares de bares espanhóis. Não é espantoso que esta realidade seja elevada à categoria de modelo imitável em toda a Europa?»

Tuesday, October 14, 2014

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Dinamarca recebe príncipes portugueses?


A principal selecção nacional de futebol defronta a Dinamarca, em Copenhaga, daqui a pouco mais de três horas. No espírito de muitos está a obrigação de ganhar este jogo de apuramento para o Europeu-2016, tendo em conta que todas as equipas do grupo em que Portugal está inserido já pontuaram.
Acredito que os comandados de Fernando Santos consigam obter um resultado positivo, ou seja, a vitória, embora o empate não me pareça um mau resultado. Este jogo não serve para recuperar os três pontos perdidos contra a Albânia, em casa, porque isso é impossível, mas sim para não ficarmos em desvantagem diante da Dinamarca. Importa não esquecer que também o adversário de hoje perdeu dois pontos contra os albaneses.
Neste cenário, considero que o jogo de sábado contra a França foi um bom ensaio. Por um lado, perceberam-se as debilidades de alguns jogadores e do actual sistema táctico. Por outro, que julgo mais importante realçar, verificou-se que há margem de progressão da equipa e dos jogadores que a compõem.
Até aqui, tudo me parece pacífico. O que me incomoda em redor da Selecção é, tão-só, algumas pessoas continuarem a falar do comportamento de Ricardo de Carvalho. Foi incorrecto e acredito que, se não foi esquecido em três anos, não o será em 100 ou 200.
Paulo Bento, que aplicou um castigo ao central que o próprio Ricardo Carvalho admitiu poder infligir se fosse seleccionador, teve uma suspensão de seis meses por um acto de indisciplina cometido ao serviço da Selecção, em 2000, após a derrota contra a França.
Nuno Gomes e Abel Xavier também foram castigados, com oito e nove meses de suspensão, respectivamente. Rui Jorge, actual seleccionador da equipa de Esperanças portuguesa, que parece ter grande mérito na forma como aqueles jovens jogadores têm representado o nosso País, era um dos portugueses em campo, mas não foi castigado como Paulo Bento, Nuno Gomes e Abel Xavier, mesmo que tivesse corrido em direcção ao árbitro auxiliar do França-Portugal, após Zidane concretizar o 2-1 a favor dos gauleses.
Não terá ido convidar o assistente para jantar ou beber um gim depois de terminada a partida, até porque se dirigiu a ele de forma pouco amistosa. O que interessa tudo isto? Nada. Ou, se interessa, é muito pouco. Porque já passaram 14 anos. Não é por passarem «apenas» três após a fuga de Ricardo Carvalho que o seu gesto deve ser mais valorizado ou continuar a causar tamanha indignação.
Todos têm direito a uma opinião, incluindo eu, mas gostava que avaliassem apenas critérios futebolísticos. Daqui a nada, quando começar o jogo, Ricardo Carvalho pode querer sair da defesa a jogar, perdendo a bola e dando origem a um golo adversário. Nesse momento, e até durante dois ou três dias, merecerá, obviamente, ser alvo de crítica devido à sua imprudência. No entanto, no próximo fim-de-semana, há mais jogos e outros alvos para atingir.
Há muitos jogos, é tudo muito rápido. Fale-se apenas de futebol e não de telenovelas com jogadores da bola, porque para isso há «imprensa especializada».
Este espírito português – quiçá, universal – de ser forte com os fracos e fraco com os fortes é, no mínimo, pouco recomendável. Tal postura tem resultado na atitude que leva a endeusar o DDT Ricardo Salgado ou o brilhante Zeinal Bava quando estes estão no topo, havendo um estrondoso reverso da medalha e consequente ataque feroz no momento da queda de tais figuras.

Coragem é defender-se quando todos atacam ou atacar-se quando todos defendem. Coragem é também o que vai ser preciso, mais logo, para termos os tais príncipes portugueses na Dinamarca.